O Coletivo

Blog do escritor Juliano Rodrigues. Aberto a textos gostosos de quem quer que seja. Contato: julianorodrigues.escritor@gmail.com

terça-feira, 30 de agosto de 2016

CONFLITO

Em uma aula dada por Marcelo Spalding sobre a necessidade do 'conflito' em um bom texto, ele utilizou um vídeo de exemplo que achei incrível. Quase não consegui assistir: pouco depois do "mas...", indicando o conflito, tive que parar e sair da sala para não passar vergonha. 
Veja e me fale:





segunda-feira, 29 de agosto de 2016



                                               LEITORES INFIÉIS

                                                                  Juliano Barreto Rodrigues


Desejo leitores infiéis. Que leiam muito além daquilo que escrevo. Promíscuos mesmo, capazes tanto de se esfregar com textos marginais quanto com os considerados “da elite”. Não reverenciem sequer os clássicos que não lhes toquem e que soltem pelo meio – sem titubear – qualquer escrito chato (retornando a ele se e quando bem entenderem, sem pedir desculpas).

Parceiros volúveis, amantes do que presta em cada página e, ao mesmo tempo, críticos mordazes do que não salva. Relação madura e íntima, com altos e baixos, sem amor cego nem dedicação exclusiva. Para gozos casuais ou algo mais.

É regra: ninguém suporta absoluta constância. Pessoas (incluindo as que leem), personagens e textos maniqueístas são terríveis. Sem oscilações no enredo, sem conflito na trama, sem dramas de consciência, não se consegue nem leitores infiéis: não se consegue leitores.

Por isso, procuro gente verdadeira, que volte aos meus rabiscos quando deles se lembrarem: como primeira ou última opção na agenda. Garanto que minhas palavras serão amantes sempre tórridas e de braços – e pernas – abertos. Dadas e igualmente infiéis*.

'Minhas palavras...', quanta pretensão. São minhas só até saírem do meu útero de autor. Paridas, tomam rumo próprio. Na tentativa de segurá-las, meto-lhes alianças, assinando meu nome.  Mas tirando as que engaveto, todas as outras vão para o mundo. Quando me deparo com alguma delas por aí, estão feitas. Me sobra um deleite incestuoso, nunca livre de alguma crítica tardia e inócua.

No ocaso desta reflexão percebo que não sou eu quem precisa de leitores. São elas, as palavras que emendei e que vivem além de mim. Criações que têm data de nascimento, destino incerto e que, espero eu, morram muito depois do autor. Então, me corrijo: desejo - A ELAS - muitos (e muito infiéis) leitores.



* Uma autocrítica urgente:

E isso de sempre usar o sexo como metáfora para falar da escrita? Se bem cabido neste texto, noutros tantos revela, por um lado, o prazer do autor pela arte, por outro, uma redundância a empobrecer o estilo. É um cacoete a se livrar. Leitores sofisticados não perdoam lugares-comuns, especialmente se repetitivos.


segunda-feira, 22 de agosto de 2016



         
            PAI ESCRITOR – PARTE III – A REDENÇÃO

                                           Juliano Barreto Rodrigues

Meu bebê tem agora um ano e um mês. Nossa, o tempo que parecia nunca passar, passou voando. Aquele ser que só balbuciava e chorava não para mais quieto, e o nosso mundo gira ao seu redor. Graças a Deus aqueles primeiros meses se foram. Sem brincadeira, tenho trauma dos três iniciais.

Tive depressão pós-parto, que tecnicamente acontece só com a mulher. Cheguei a tomar um tarja preta, mas como bebi todos os dias desde um mês antes do nascimento até seis meses depois, larguei o remédio (a mistura era indigesta). O que importa é que, seja a base de remédio ou de álcool, no fim sarei.

Meu problema foi a mudança de hábitos, não o nenem. Ele, por sinal, sempre foi muito cooperativo. Acredito até que o carisma dele que me curou.

Ser pai é incrível! A vida vai para outro patamar. Sei que é muito clichê dizer isso, mas é uma experiência que todo homem deveria viver. Descobre-se um amor esquisito, visceral, atômico. Uma força descomunal, que domina toda célula da pessoa, transformando-a. É uma abdução alienígena, com direito a reprogramação mental completa.

E sobre escrever e ter filho? - aliás o tema dessa conversa - Ah, é aquilo de que já havia falado: não sobra tempo. Se pegar uma caneta e um papel, o bebê toma na hora; computador? – brinquedo dele; celular então? – tente mandar uma mensagem que seja, ele salta sobre o aparelho e o mete na boca. É TU-DO dele. Escrever se torna um ato furtivo, algo que se faz escondido e às pressas quando se consegue assumir, por alguns segundos, a identidade secreta de escritor.

Em uma entrevista que dei para uma mídia alternativa de Portugal, que está trabalhando em uma matéria sobre gente que escreve em blogs e coisas afins, me perguntaram sobre a rotina de escrita. Eu disse: “Rotina? Isso é o que eu não tenho. Na verdade, tenho um namorico com a literatura. Penso nela todos os dias, tenho amor, paixão e desejo, mas só nos encontramos de vez em quando (para um sexo rápido, kkkkk). É o que dá. Sonho em noivar e casar, mas já tenho esposa e filho. Embora tenha certeza de que eles não vão ficar chateados com essa bigamia. Por enquanto, eu e ela (a literatura) vamos continuar nos pegando escondidos”.

Por outro lado, ter ideias se torna mais fácil. Quem escreve depende de musas, e um filho por quem se tem adoração absoluta é uma musa mega power. Todas as possibilidades do mundo invadem a cabeça. Os sentimentos mais recônditos e as sensações esquecidas lá na infância brotam do nada e crescem instantaneamente, feito feijões mágicos fertilizados com adubo de Kripton. Tudo fica superlativo, adjetivado e adverbiado. O cérebro é invadido pelo coração. Não mais se raciocina friamente. Tudo agora é quente e sentimental. É como se evoluíssemos de repente para uma mente feminina, capaz de pensar e sentir intensamente a um só tempo.

No frigir dos ovos, o escritor ganhou. Se falta tempo, sobram ideias. O sentimento de urgência torna o cérebro mais eficiente. A necessidade – e é isso que a escrita é para mim – faz o sapo pular. Ser pai inspira e me torna mais criativo. Basta você pensar nas mil artimanhas que se desenvolve todos os dias para fazer uma criança comer – a gente vira PHD na arte da distração, e escrever ficção é justamente isso, distração e entretenimento. No fim, tudo tem que ser, ou parecer, o mais divertido possível, senão, não desce.

Venero a escrita – porque me dá uma liberdade imensa. Mas adoro muito mais meu filhote – a quem me prendo voluntariamente. Eis a relatividade das coisas.

Nas artérias que irrigam o braço do escritor correm a plenitude, o carinho, a presença do filho. Assim, as palavras que escorrem no papel já não são só do autor, mas da dupla que formam. Então, que essa parceria dê belos frutos!

Como pai coruja, peço, para fechar nossa conversa, que permitam um recado ao meu inspirador:


– Obrigado por existir, meu amor!



quarta-feira, 3 de agosto de 2016



                                            VERDADE SEJA DITA



Vi dia desses, no Canal Curta, a poetisa Mel Duarte declamando “Menina Melanina” e fiquei empolgado com sua pena engajada e afiada. Sabe quando a gente lê uma coisa que gostaria de ter escrito? Foi assim. Principalmente com os últimos versos do poema:

“[...]
Preta, pretinha
Não ligue pro que dizem essas pessoas,
E só abaixe a tua cabeça
Quando for pra colocar a coroa.”

Me perguntei: – Em que mundo eu estava que ainda não conhecia nada de Mel Duarte? – Putz, dá para ver nos olhos dela a força do seu discurso. Aquele “só abaixe a tua cabeça quando for para colocar a coroa” ficou ressoando na minha cabeça.

Mel é uma poetisa publicada, que usa todas as mídias para dar seu recado. Além do estímulo da sua escrita, dá também exemplo aos escritores iniciantes do que fazer para se fazer ouvido e conhecido. Me tornei fã e leitor.

Como referência, é um contraponto interessante para mim: para fugir um pouco da abstração e tratar de situações mais concretas. As palavras podem (e devem) ser usadas como ferramentas para mudar realidades erradas.

Para terminar, deixo o link de “Verdade seja dita”, resposta dada a Bolsonaro, motivada por uma infeliz fala sua à deputada Maria do Rosário. Sintam a força da verve de Mel: